Supremo valida acordo coletivo que limita direito do trabalhador sobre horas de deslocamento

Maioria dos ministros considerou que convenções podem liberar empresas de pagar horas referentes ao trajeto do trabalhador. Decisão tem repercussão geral, por isso deverá ser aplicada em outros casos.


sexta-feira junho 3, 2022

O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira (2), por maioria, validar normas coletivas de trabalho (acordos fechados entre patrões e trabalhadores) que reduzem ou limitam as chamadas horas ‘in itinere’ (tempo gasto pelo trabalhador no deslocamento entre casa e trabalho).

Na ação, a Mineração Serra Grande S.A., de Goiás questiona decisão do Tribunal Superior do Trabalho que invalidou uma convenção coletiva que liberou a empresa de pagar as horas referentes ao trajeto do trabalhador, caso a companhia fornecesse transporte.

Para a mineradora, o TST feriu o princípio constitucional da prevalência da negociação coletiva. Ela alega estar situada em local de difícil acesso e afirma que o horário do transporte público é incompatível com a jornada de trabalho.

Na sessão desta quarta-feira (2), Mauro de Azevedo Menezes, advogado do trabalhador que entrou com a reclamação trabalhista contra a mineradora, argumentou que a negociação coletiva que elimina direitos legais não pode ser um “cheque em branco” assinado por dirigentes sindicais.

Processos suspensos

Em 2019, o relator do caso, ministro Gilmar Mendes  determinou a suspensão de todos os casos semelhantes na Justiça trabalhista até que o plenário se manifeste sobre o assunto.

A decisão do STF tem repercussão geral, ou seja, deverá ser aplicada aos processos semelhantes pelas instâncias inferiores do Judiciário. Ao todo, mais de 66 mil processos em todo o país aguardam um posicionamento do Supremo.

Voto do relator

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes , votou a favor de considerar válido o acordo coletivo relacionado às horas de deslocamento.

Gilmar afirmou que o Supremo já “firmou orientação no sentido de que deve ser privilegiada a norma coletiva de trabalho, desde que os temas pactuados não sejam absolutamente indisponíveis [aqueles dos quais o trabalhador não pode renunciar]”.

Segundo o ministro, também já houve entendimento de que, em relação às horas de deslocamento, “se trata de direito que pode ser pactuado de forma diversa ao previsto na legislação trabalhista”. “Trata-se de direito sujeito à autonomia da vontade coletiva.”

Votos dos ministros

  • André Mendonça: acompanhou o relator. Segundo o ministro, os sindicatos representam categorias e o Supremo tem dado atenção aos direitos individuais.
  • Nunes Marques: acompanhou o relator. Marques afirmou que o direito de transporte é tratado pela Constituição de forma autônoma. “A importância das convenções é indiscutível”, disse.
  • Alexandre de Moraes: acompanhou o relator. “Não é possível o acordo coletivo afastar o direito social reconhecido pela Constituição e por tratados internacionais, mas é possível a negociação de direitos disponíveis”, argumentou.
  • Luís Roberto Barroso: acompanhou o relator. Barroso afirmou que o trabalhador enfrenta, em muitas cidades, longas horas de deslocamento, mas que essa é uma questão da administração pública. “Não me parece que deva recair sobre o empregador este ônus”, afirmou.
  • Dias Toffoli: acompanhou o relator. Toffoli citou que essa regra pode ser aplicada de forma diferente em um país complexo como o Brasil.
  • Cármen Lúcia: acompanhou o relator. A ministra afirmou que no caso concreto a Constituição não foi desrespeitada.
  • Edson Fachin: divergiu do relator. Fachin afirmou que a convenção não está de acordo com a Constituição. “Não se me afigura admissível interpretação que, ao invés de garantir o cumprimento da Constituição Federal, subscreva sua própria desconstitucionalização”, disse.
  • Rosa Weber: divergiu do relator. A ministra citou que tem havido um enfraquecimento dos sindicatos em razão do aumento do desemprego. Por isso, há a necessidade de proteção da parte mais fraca.

Fonte : G1