Open banking completa 1 ano e enfrenta desafios para deslanchar; entenda como funciona

Sistema de compartilhamento de dados bancários entre instituições financeiras ainda é usado por um grupo relativamente pequeno de clientes; segundo pesquisa, a adesão esbarra na falta de informação


terça-feira fevereiro 1, 2022

Com a promessa de criar um “shopping financeiro” personalizado para cada cliente, o open banking, compartilhamento entre os bancos de informações dos clientes, completa um ano nesta terça-feira, 1º, com a missão de conquistar o público.

Até o fim de janeiro, o Banco Central contabilizava 3,3 milhões de consentimentos para compartilhamento de dados, passo essencial para os consumidores desfrutarem de melhores condições no relacionamento financeiro. O número ainda é pequeno diante do total da população bancarizada no Brasil, que ultrapassa 180 milhões, segundo dados informados pelas instituições financeiras ao BC.

Desde agosto, a população já pode compartilhar seus dados bancários com outros bancos e fintechs, além daqueles que têm relacionamento. A ideia é aumentar o volume de informações no sistema financeiro, de modo que as instituições possam ofertar produtos e serviços personalizados para os clientes, com melhores taxas e menor risco.

Em tese, o open banking permitiria a um cliente receber uma oferta de um crédito mais barato de um banco X com o qual não tem relacionamento antes de ele entrar no cheque especial no banco Y. Já o banco Y, ao perceber que o seu cliente vai pegar o crédito em outra instituição para fugir do cheque especial, poderia fazer uma contra-oferta.

Em dezembro, o BC deu início à última fase do open banking, com a inclusão do compartilhamento de informações de investimento, seguros, previdência e câmbio. A agenda de implementação é feita em etapas e só deve terminar em setembro deste ano.

Pesquisa da consultoria americana Bain & Company divulgada em dezembro mostra que a adesão ainda esbarra na falta de informação. Conforme a sondagem, só 14% dos brasileiros sabiam o que era open banking entre julho e setembro, embora quase a metade dos cerca de 8.500 participantes já tinham ouvido falar sobre a medida.

O sócio da consultoria, Antonio Cerqueiro, afirma que, para decidirem compartilhar suas informações, os clientes precisam entender na prática o que é o open banking. Para isso, é necessário que bancos, fintechs e empresas de tecnologia criem novos produtos e serviços para convencer a população. “O entendimento e a utilização do open banking vão estar mais atrelados a quais são os casos de uso que vão se alavancar dos dados que são compartilhados (no sistema).”

Observando a experiência da Europa, onde o open banking já está mais maduro, Cerqueiro cita como exemplo de casos de uso processos mais simples e rápidos para abertura de conta digital ou consolidação das informações financeiras em um único aplicativo, além de iniciação de pagamentos, para fechar uma compra em uma loja virtual, por exemplo, sem cartão ou a necessidade de entrar no aplicativo do banco.

A familiaridade da população com o assunto e a confiança na segurança do sistema também é vista como principal desafio para a evolução do open banking por Nic Marcondes, sócio da Quan.to, plataforma que facilita a conexão para a transmissão de dados de clientes para instituições financeiras.

Marcondes argumenta que o sistema tem várias camadas de proteção e é diferente do Pix, pois as informações só circulam entre as instituições financeiras, que têm que seguir diversas normas do BC, e não chegam na ponta.

Antes mesmo de o BC implementar o open banking, a empresa já tinha uma solução que faz a conexão direta dos dados de clientes para as instituições, com base na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A solução, segundo Marcondes, já impactou 4 milhões de pessoas, o que dá uma ideia do potencial da ferramenta do BC.

Já a estimativa da FCamara, empresa de desenvolvimento de soluções digitais, é de que o compartilhamento de dados pelo sistema alcance 5 milhões de pessoas em 2022.

“Não é pouco? Infelizmente, temos uma realidade no Brasil em que a população não é tão bancarizada e uma parcela dos bancarizados não tem acesso a canais digitais, o que é essencial para o open banking”, avalia Nic Marcondes.

Mesmo com baixo conhecimento da população até agora, a Bain & Company projeta que a evolução sistema no Brasil deve ser mais rápida do que na Europa, onde a legislação entrou em vigor em 2018.

A expectativa é de que o open banking brasileiro demore a metade do tempo que foi necessário no Reino Unido para alcançar o nível de utilização atual, em termos relativos.

Segundo dados de janeiro, o Brasil tem cerca de 90 milhões mensais de chamadas de API, as conexões para compartilhamento de dados pelas instituições, enquanto no Reino Unido o número roda em torno de 800 milhões. “O que demorou 36 meses na Inglaterra, o Brasil pode atingir em 12 a 18 meses”, diz Cerqueiro.

No Reino Unido, há cerca de 4 milhões de autorizações para compartilhamento de dados, com população total de 67,2 milhões de pessoas.

O sócio da Bain & Company ainda afirma que a agenda da iniciativa no Brasil é mais robusta e ambiciosa, ao incluir o compartilhamento de outros dados, além dos bancários, como investimento, seguro e câmbio, e também corrigiu alguns problemas da legislação europeia.

Uma das evoluções do open banking no Brasil é a exigência de que todas as instituições participantes compartilhem informações, ao contrário da Europa, em que pequenos bancos e fintechs não são obrigados. Outro passo adiante é o Pix, sistema de pagamento instantâneo que caiu nas graças do brasileiro.

Benefícios

Para Marcondes, da Quan.to, 2021 foi o ano de definições do open banking no Brasil, e este ano será o ano de resultados.

Segundo ele, o sistema vai acabar com o “supermercado de um produto só” no sistema financeiro, em que os bancos só ofertam seus próprios produtos em suas redes de relacionamento digitais. “O open banking será um shopping financeiro customizado para você, para a sua necessidade, com produtos de várias instituições em um mesmo lugar.”

A maior expectativa é pela iniciação de pagamentos via open banking. O sócio da Quan.to ainda acredita que irá funcionar como vitrine para instituições pequenas, que vão poder expor seus produtos em aplicativos de bancos e fintechs maiores.

“Eu acho que o open banking provocará redução de concentração, pois instituições menores podem acessar clientes que antes eram inacessíveis”, concorda o professor de Finanças da FGV-SP, Rafael Schiozer.

Entenda o novo sistema

O que é open banking?

É um sistema que vai permitir o compartilhamento de dados dos clientes entre instituições financeiras – bancos, fintechs e cooperativas de crédito – desde que autorizado pelo consumidor.

Como o open banking funciona?

A comunicação entre os bancos se dará por meio de APIs (Application Programming Interface). É uma tecnologia semelhante à que se utiliza no compartilhamento de logins entre sites – por exemplo, quando os dados de autenticação de uma rede social são usados para logar no sistema de uma plataforma de streaming. Também é por meio das APIs que o cliente dará o consentimento para compartilhamento de seus dados.

O que muda para o consumidor com o open banking?

O open banking deve proporcionar uma igualdade de condições para as instituições financeiras em termos de ofertas, o que deve aumentar a concorrência entre elas e garantir melhores oportunidades para o consumidor. Tendo acesso a propostas de diferentes instituições, ele poderá escolher o produto mais adequado e com condições melhores. No futuro, em apenas um aplicativo será possível gerenciar produtos e serviços de 2, 3 e até mais bancos.

O open banking é seguro?

O Banco Central garante que sim. Os dados ficarão dentro das bases dos bancos, como já ocorre hoje. Não existirá centralização das informações em “nuvem”. Além disso, por imposição do BC, foi criada uma estrutura de governança que será gerida pelo mercado financeiro, para haver monitoramento 24 horas por dia, sete dias por semana, nos sistemas.

Fonte: Terra